PGFN defende ajustes em regras de contencioso para diminuir potenciais litígios
Por: Cristiane Bonfanti, Bárbara Mengardo e Fabio Graner
Fonte: Jota Tributario
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) mapeia pontos da reforma
tributária do consumo que podem causar litígio. Ao JOTA, a procuradora-geral,
Anelize Ruas de Almeida, afirmou que a forma de cobrança de dívidas da CBS
e do IBS, a competência para julgar os dois tributos e a repartição das receitas
entre os entes federados estão entre os pontos com grande potencial de gerar
judicialização e que ela defende que sejam ajustados para diminuir o potencial
de litigância no novo sistema.
“A regulamentação é um ponto decisivo para evitar litígios. Quanto mais fiel à
norma ela for, quanto menos ela inovar, do ponto de vista de criar obrigações
ou limitar direitos que estão na lei complementar, melhor”, afirmou Almeida.
A procuradora informou que a PGFN tem atuado em parceria com a Receita
Federal e com as procuradorias estaduais e municipais para interpretar as novas
regras tributárias. O objetivo é aplicá-las de forma harmônica e reduzir o risco
de contencioso sobre a reforma. Para ela, porém, seria importante ter mudanças
no PLP 108/2024, em tramitação no Senado Federal.
Entre as propostas defendidas por Almeida está a alteração na função do Fórum
de Harmonização Jurídica das Procuradorias, para que ele deixe de ser apenas
consultivo, e a redução no prazo máximo de um ano para a inscrição de débitos
na dívida ativa.
Almeida ressaltou que a reforma tributária do consumo tem como princípios e
pilares a transparência, a simplicidade e a redução de litígios. Com a definição
da mesma base de cálculo para a CBS e o IBS, a não cumulatividade ampla, o
sistema de cashback e o split payment em pleno funcionamento, disse, resolvem
a maior parte dos conflitos.
No entanto, na hora de tirar a reforma do papel e colocá-la em prática, novos
desafios devem surgir envolvendo as questões processuais e o funcionamento
do novo sistema.
Cobrança da dívida pode causar litígio
No que diz respeito à cobrança da dívida, a procuradora-geral disse que, se nada
mudar, a PGFN manterá o padrão atual de cobrança para a CBS, tributo de
competência da União. Ou seja, a CBS será cobrada na Justiça Federal, e o
débito será inscrito em dívida ativa. O problema, observou, é que a Justiça
Federal muitas vezes trabalha em uma velocidade diferente da dos Tribunais de
Justiça estaduais. Desse modo, como a CBS e o IBS, de competência estadual e
municipal, incidem sobre o mesmo fato gerador, o contribuinte poderá sofrer
cobranças em diferentes esferas correndo em ritmos diferentes.
“E como vou reconhecer eventualmente a responsabilidade tributária pelo
pagamento da CBS de um grupo econômico sem olhar para o IBS, se o fato
gerador é o mesmo? Essas são questões que me preocupam imensamente e
estão sendo debatidas dentro do âmbito da PGFN”, afirmou Almeida.
Quanto à repartição das receitas da CBS e do IBS, a procuradora-geral também
enxerga potencial judicialização, principalmente entre estados e municípios.
“Quem é o titular do crédito [de IBS]. É o Comitê Gestor do IBS ou são os
entes subnacionais. Esse é um litígio que pode aparecer”, disse.
Por fim, Almeida avalia que a competência para julgar tanto administrativa
quanto judicialmente as controvérsias envolvendo os novos tributos será outro
ponto de conflito judicial. Por exemplo, a procuradora-geral questiona se uma
rede varejista desenvolver negócios com todos os estados e municípios, ela terá
de litigar com todas as fazendas municipais e estaduais? Ou somente com o
Comitê Gestor do IBS?
No que diz respeito à falta de integração para a cobrança e o julgamento dos
novos tributos, em relatório apresentado em abril de 2025, o Superior Tribunal
de Justiça (STJ) concluiu que a instituição da CBS e do IBS podem triplicar o
contencioso judicial. De um lado, cada titular do crédito tributário (estado,
município e União) moverá execução fiscal envolvendo um mesmo fato
gerador. De outro, pode haver uma multiplicação de ações por parte dos
contribuintes, uma vez que cada impugnação deverá ser direcionada também
contra estado, município e União.
Regulamentação da reforma tributária
A procuradora-geral defende alterações no PLP 108/2024, que cria o Comitê
Gestor do IBS e regulamenta o julgamento administrativo do tributo. O texto,
aprovado na Câmara dos Deputados em novembro de 2024, pode ser votado
em setembro no Senado.
Entre as mudanças defendidas pela PGFN no PLP 108/2024, Almeida destaca
alterações na função do Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias.
O artigo 111 do projeto de lei define que, para realizar sua atividade, o Comitê
de Harmonização das Administrações Tributárias ouvirá obrigatoriamente o
Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias. O problema, diz a
procuradora-geral, é justamente o fato de o fórum ser apenas consultivo. Ela
defende que ele passe a ter legitimidade para demandar o Comitê de
Harmonização, e não apenas forneça informações a ele.
Almeida afirma ainda não se opor ao pedido da sociedade civil para integrar o
Comitê de Harmonização. Ela destaca que o papel do Comitê e do Fórum é de
harmonizar as normas e criar jurisprudência administrativa e que parece ser
limitante ter o ponto de vista apenas do ator fiscal.
Outra proposta da PGFN é alterar o prazo de um ano fixado no PLP 108/2024
para que débitos tributários sejam inscritos na dívida ativa. A procuradora-geral
defende que deve ser mantido o prazo atual de 90 dias para casos gerais; de 120
dias para contribuintes que participarem de programas de conformidade; e de
60 dias para aqueles que sofrerem investigação fiscal ou tiverem mau histórico
de pagamento.
“O principal critério de eficiência em qualquer cobrança é o tempo. No dia 1º
já começa o risco da inadimplência e, a cada dia, esse risco aumenta. Então,
quanto mais rapidamente você traz o contribuinte para o controle de legalidade
e realiza a execução forçada, a chance de recuperação daquele crédito é maior”,
afirma.